Gestão
Mapa do labirinto das leis trabalhistas
Revista Negócios e Sabores-ED.3
Publicado em 10.12.2016
Um guia básico das regras e acordos sindicais que fazem parte do dia a dia de seu restaurante.
A área de alimentação fora do lar é altamente sindicalizada. O lado bom disso é que as regras que ditam a relação empregador - empregado estão bem determinadas pelas convenções coletivas de trabalho, acordos firmados entre os sindicatos de trabalhadores e sindicatos de proprietários de estabelecimento, o que garante que ambos os lados da mesa de negociação consigam chegar a um meio-termo que respeite seus interesses. O lado “ruim” é que as regras variam de região para região, de acordo em acordo, e os proprietários precisam ficar ligados às mudanças mais recentes. O que pode ser tão cansativo quanto enlouquecedor. Tanto que é comum os proprietários jogarem esse tipo de preocupação nas mãos de advogados ou contadores. É compreensível. Mas um bom empresário precisa reter ao menos um conhecimento básico sobre todos os aspectos de seu negócio, e leis trabalhistas, por mais cabeludas que sejam, não devem ficar de fora.
No mundo pós-Google e redes sociais, todo negócio é também uma marca. O que significa estar presente e conversar o tempo todo no mundo virtual. Se por um lado isso faz aumentar a quantidade de funções que você precisa desempenhar como dono do negócio, por outro lado também aumenta a visibilidade e atrai novos clientes.
“A primeira coisa que um proprietário deve fazer é entrar em contato com os sindicatos de sua região”, recomenda Concetta Marcelino de Prizio, docente do curso de Planejamento e Administração de Restaurantes e Bares do Senac. "Todo estabelecimento precisa estar 100% dentro da lei, e o melhor jeito de fazer isso é se inteirar do acordo sindical mais recente firmado entre as entidades patronal elaboral da área. "Na prática, isso significa que você, proprietário, deve pelo menos buscar no site do sindicato de sua área os mais recentes documentos de Convenção Coletiva de Trabalho.
Prepare-se para uma leitura atenta: as convenções coletivas são acordos longos, escritos em linguagem formal, que determinam regras que vão desde o piso salarial dos funcionários de um restaurante até o seguro de vida e a estrutura de férias. O melhor a fazer é anotar eventuais dúvidas e consultar um advogado trabalhista ou seu contador para compreender os meandros legais que devem ser observados em seu estabelecimento.
Para ajudá-lo a navegar nesse labirinto, reunimos algumas cláusulas comuns de se encontrar em acordos sindicais e comparamos como elas foram abordadas nos acordos mais recentes de cinco capitais diferentes: São Paulo, Recife, Belém, Goiânia e Porto Alegre. Tenha em mente que essas convenções estavam em vigor até o fechamento desta edição, mas provavelmente foram alteradas até a data de publicação.
Adicional noturno
São paulo: A convenção coletiva (acordo sindical) da cidade de São Paulo não define explicitamente o que é considerado trabalho noturno. Então, usa-se a definição da Consolidação das Leis Trabalhistas, que considera trabalho noturno aquele exercido entre as 22 e as 5 horas. O acordo mais recente determina que cada hora trabalhada no horário noturno tem um acréscimo de valor de 25%.
REcife: O adicional noturno é de 30% por hora, e o acordo deixa claro que, caso um funcionário seja movido do horário noturno para o diurno, ele perde o direito a esse adicional. O horário noturno, aqui, também é o da CLT: das 22 às 5 horas, e o acordo deixa isso explícito no texto (embora não seja necessário).
BelÉM: O adicional noturno foi fixado em 25%. A convenção também usa a definição de horário noturno da CLT (das 22 às 5 horas) e chama atenção para outro aspecto da lei sobre esse turno: a duração da hora de trabalho é de 52 minutos e 30 segundos. Ou seja, se o trabalhador começar a trabalhar às 22 horas, ele deve ser dispensado às 4 horas e, mesmo assim, receber pelas oito horas.
Goiânia: O acordo vigente em Goiânia não tem uma cláusula específica sobre adicional noturno. Portanto, vale o que define o artigo 73 da CLT: o horário noturno é das 22 às 5 horas, a hora de trabalho tem duração de 52 minutos e 30 segundos, e o adicional de salário é de 20% por hora trabalhada.
Porto alegre: Aqui tampouco há uma cláusula específica sobre o adicional noturno. Então, valem as normas da CLT: 20% descritas acima. Este acordo tem uma particularidade: trabalhadores que terminam sua jornada entre as 23 e as 7 horas devem receber seus salários um dia antes dos demais, exceto se o pagamento for feito por transferência bancária.
Roupas de trabalho
São paulo: Os uniformes de trabalho devem ser fornecidos gratuitamente aos funcionários, se a própria empresa (ou a lei) determinar o uso. A empresa também deve manter e lavar os uniformes, ou pagar 37,05 reais mensalmente a cada funcionário para que ele o faça. Essa cláusula de taxa de manutenção não se aplica se o uniforme for apenas um avental.
Recife: Os uniformes também devem ser oferecidos gratuitamente, só que o acordo não determina quem é responsável por sua manutenção, apenas expõe que caso o funcionário danifique o uniforme, a empresa poderá cobrar indenização em parcelas com valor máximo equivalente a 10% do salário do funcionário.
Belém: Devem ser fornecidos anualmente o mínimo de dois uniformes por funcionário, incluindo luvas e calças. Aqui, tampouco é definido quem é responsável pela manutenção, mas o funcionário deve devolvê-los ao final do contrato sem danos além do desgaste natural.
Goiânia: As empresas devem fornecer ao menos dois uniformes novos por funcionário todo ano, ambos no primeiro mês de trabalho. No ato, as empresas devem emitir um comprovante, reter uma cópia e entregar a outra ao funcionário. Ao fim do contrato, o funcionário devolverá os uniformes, ou pagará seu valor no acordo rescisório. A empresa não precisa fornecer o vestuário básico de garçom: paletó, calça preta e camisa branca. E se o uniforme não tiver logomarca da empresa, é possível “vendê-lo” ao funcionário por 50% do custo, se ambos preferirem.
Porto Alegre: As empresas devem fornecer os uniformes gratuitamente. A conservação fica por conta do funcionário, que deve devolvê-lo ao final do contrato de trabalho ou pagar seu valor no acordo rescisório.
Adicionais por “fidelidade”
São paulo: No caso da demissão de um funcionário sem justa causa, o empregador paga como indenização dois dias de salário por ano de serviço. Ou seja: tem seis anos de casa, recebe 12 dias de salário de indenização. Recentemente, essa cláusula recebeu uma correção: ela só leva em consideração o tempo de serviço entre 1 de julho de 1994 e 30 de junho de 2013. Funcionários contratados a partir dessa última data não têm mais direito a essa indenização.
Recife: Funcionários que têm mais de cinco anos de casa e estão a um ano da aposentadoria devem avisar à empresa com antecedência, por escrito. Feito isso, esse funcionário está “protegido” de demissão (sem contar justa causa) e, ao fim do tempo de serviço, receberá um “Prêmio Aposentadoria” equivalente a dois salários.
Belém: A partir de um ano completo de serviço na mesma empresa, o funcionário passa a receber um adicional por tempo de serviço de 1% de seu salário-base por cada ano de trabalho. Ou seja, se está há dois anos na empresa, recebe, ao final do segundo ano, um acréscimo de 2% no salário; ao fim do terceiro ano, um acréscimo de 3%, e assim por diante. Esses acréscimos não integram o salário-base.
Goiânia: Todo funcionário que trabalhar para a mesma empresa continuamente recebe, a cada três anos, um acréscimo de 3% sobre o salário-base, e 5% a cada cinco anos. Esses adicionais não são cumulativos nem passam a integrar o salário-base.
Porto Alegre: A cada cinco anos de serviço para a mesma empresa, o funcionário recebe um aumento de 3% em seu salário. Esse aumento, porém, não passa a compor o salário-base – é pago à parte. Ou seja, depois de cinco anos, o funcionário passa a receber todo mês um bônus que equivale a 3% de seu salário. No décimo ano, passa a receber um segundo bônus equivalente a 3% de seu salário-base, também todo mês.
Alimentação
São paulo: Empresas que trabalham com refeições devem fornecê-las aos trabalhadores no local de trabalho, podendo descontar de seus funcionários no máximo 1% do valor do piso salarial mais baixo exercido no estabelecimento. Ou seja, se o salário mais baixo de seu restaurante é o de copeiro, que recebe 800 reais por mês, você poderá cobrar de cada funcionário, no máximo, 8 reais por mês de alimentação.
REcife: As empresas podem fornecer refeições entre as jornadas de trabalho a seus funcionários no local de trabalho, cobrando apenas 20% do valor total da refeição. As empresas também podem contratar terceiras que forneçam “quentinhas”.
BelÉM: As empresas com mais de cinco funcionários devem fornecer refeições, se eles exigirem o benefício. O valor do benefício pode ser cobrado mensalmente dos funcionários usando um percentual sobre o salário mínimo nacional: 3% para café completo ou lanche, e 5% para almoço ou jantar. Estabelecimentos que fazem turnos de seis horas não entram nessa regra.
Goiânia: Devem fornecer aos funcionários, gratuitamente, uma refeição a cada jornada de trabalho, dentro do cardápio da empresa, desde que estejam inclusos: arroz, feijão, carne, verdura e salada. Como alternativa, as empresas podem fornecer marmitex com esses ingredientes. Empresas de fast-food podem fornecer itens do próprio cardápio aos domingos e feriados, ou após as 22 horas, se funcionarem as 24 horas do dia.
Porto alegre: O acordo não tem uma cláusula sobre a alimentação dos funcionários.
Adicional noturno
Existem, sim, outras formas de trabalho que não configuram vínculo empregatício e livram o proprietário de pagar os encargos trabalhistas. O problema é que os sindicatos ficam atentos a esses tipos de vínculo, e em alguns casos os proíbem totalmente no caso de funcionários de bares e restaurantes. De novo, sempre vale observar a legislação local e consultar um bom advogado trabalhista. Mas a legislação reconhece os funcionários autônomos: profissionais independentes, que assumem por conta própria os riscos de seu negócio. Alguns buffets utilizam esse tipo de contrato para mão de obra ocasional, e sempre tomam o cuidado de não chamar o mesmo funcionário regularmente. A terceirização costuma ser proibida no ramo de bares e restaurantes para as atividades centrais das empresas, mas é possível contratar terceiros para segurança e limpeza, por exemplo.