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Onda vegetariana deve se tornar cada vez mais forte em restaurantes

Revista Negócios e Sabores-ED.1

Publicado em 20.04.2022

Quem pensou que a tendência de os restaurantes aderirem cada vez mais a pratos vegetarianos era apenas uma onda vai precisar se acostumar com a tendência que deve se tornar cada vez mais potente. Das redes de fast food à alta gastronomia, o mercado de alimentação fora do lar tem buscado oferecer cada vez mais receitas à base de vegetais (os tais plant-based) para suprir uma demanda que não para de crescer.

Uma pesquisa realizada pelo The Good Food Institute junto ao Ibope no final de 2020 aponta uma queda no consumo de carne como tendência entre os brasileiros. Houve, segundo as entrevistas feitas com 2 mil pessoas de todo o Brasil, um crescimento do estilo de vida “flexitariano” (ou seja, que tem priorizado o consumo de vegetais), adotado por 29% da população em 2018 e que, em dois anos depois, apresentou um crescimento significativo, com mais da metade dos brasileiros dizendo seguir esse tipo de dieta. Muitos afirmam ter reduzido drasticamente o consumo de carne na semana.

No mundo todo, os números seguem a tendência de aumento. Nos EUA, hoje quase 10 milhões de pessoas se declaram veganos (isso sem contar com vegetarianos ou flexitarianos), um aumento de mais de 300% em pouco mais de uma década. Vai ser difícil que essa onda verde pare, acreditam os especialistas.

No universo da alta cozinha, que pauta muitos dos comportamentos que serão adotados pelos restaurantes ao redor do mundo no futuro, muitos chefs já começam a fazer um tipo de conversão aos vegetais. É o caso do Eleven Madison Park, o restaurante liderado pelo celebrado Daniel Humm, que decidiu abolir sumariamente todas as proteínas animais de seu menu a partir de setembro passado.

A decisão causou polêmica: o chef fez a aposta mais arriscada de sua carreira – pelo bem do planeta, como disse. Poderia ter dado muito errado, mas não deu: há lista de espera para comer no restaurante e outros começam a ser influenciados pela decisão do chef americano. “A decisão do EMP de se tornar vegano já impactou as conversas. Comer mais plantas é o futuro”, afirmou o também influente chef René Redzepi, do Noma (Copenhagen), em seu perfil do Instagram.

Mas para além das cozinhas estreladas, os restaurantes mais casuais também parecem mais dispostos a aumentar seu foco nos vegetais. Cada vez há mais pratos nos cardápios que não se restringem a uma “saladinha”, de olho em um público que não quer abrir mão de sabor e da experiência à mesa.

Independente das razões – a defesa do bem-estar animal, a preservação do planeta ou a busca por uma alimentação mais saudável – as pessoas optam por dietas plant-based e querem ter mais opções que saem do trivial, algo que os cozinheiros já passaram a perceber (e adotar). Nesse sentido, a criatividade tem sido uma aliada para criar pratos instigantes com a limitação de não se usar proteínas animais (ou até mesmo de derivados, no caso dos veganos).

No Naturalie, no Rio de Janeiro, a chef Nathalie Passos oferece uma cozinha cheia de sabor em pratos como sua famosa feijoada vegana, feita com abóbora e tofu defumado, o bife de feijão (servido acebolado com batatinhas e salada) e o gnocchi de batata roxa com molho bechamel de castanhas e pesto de ervas. Ela diz que, apesar de ser crescente, é uma tendência que nem todo mundo presta tanta atenção hoje.

“No geral ainda vejo chefs brasileiros sem saber a diferença de vegetariano, vegano, fitness, natureba e afins e tratando esse tema com muito desinteresse e até um certo desrespeito, como se comida vegetariana não merecesse tanta consideração”, diz ela.

Nathalie ainda acredita que o exemplo de restaurantes como o EMP e inclusive outros no Brasil podem ajudar a mudar essa perspectiva. “Espero que exemplos como A Casa do Porco [em São Paulo], que ousou fazer um menu inteiro vegetariano em um lugar conhecido justamente por servir um baita porco e que tem uma visibilidade imensa hoje, faça com que as pessoas se perguntem mais o porquê disso”, afirma.

No final do ano passado, o restaurante Geranium, eleito o segundo melhor do mundo na lista dos 50 Best de 2021, também anunciou que ia deixar de servir carne, em um movimento cada vez mais crescente. O chef dinamarquês Rasmus Kofoed explicou que o menu ia passar a ser ainda mais um reflexo de suas escolhas, já que pessoalmente ele não come carne há 5 anos.

“Deixar de servir carne me pareceu uma decisão lógica e uma progressão natural do meu trabalho”, diz. Para ele, não contar mais com animais no menu vai permitir uma nova perspectiva de seu trabalho criativo. “Há muitas perspectivas na gastronomia sem carne, é dever dos cozinheiros explorá-las”, aconselha.

Talvez os empresários e profissionais da área devam se atentar para a oportunidade que podem ter, se abrirem a perspectiva de olhar para um novo consumidor que quer se relacionar com a comida de um modo diferente, privilegiando ou optando apenas pelos vegetais. “Não é só sinalizar um ou outro item sem graça de seus menus como ‘opção vegetariana’ só porque tá todo mundo fazendo, sabe?”, conclui Nathalie. É perceber que a mudança veio para ficar.